sexta-feira, 30 de agosto de 2013

A Maldição do titã - capitulo 19



                            Os deuses votam como nos matar

Voar era suficientemente ruim para um filho de Poseidon, mas voar direto para o palácio de Zeus, com trovões e relâmpagos rodopiando em volta, era ainda pior. Nós circulamos sobre o centro de Manhattan, fazendo uma órbita completa em torno do Monte Olimpo. Eu estivera lá apenas uma vez, viajando de elevador até o secreto sexcentésimo andar do edifício Empire State. Dessa vez, se possível, o Olimpo me fascinou ainda mais.

Na escuridão do começo da manhã, tochas e fogueiras faziam os palácios da encosta da montanha reluzirem em vinte cores diferentes, de vermelho sangue a azul índigo. Aparentemente, ninguém dormia no Olimpo. As ruas retorcidas estavam cheias de semideuses, espíritos da natureza, e deuses menores fazendo alvoroço, montando carruagens ou liteiras carregadas por ciclopes. O inverno parecia não existir aqui.

Capturei o aroma de jardins em plena florescência, jasmins, rosas e coisas ainda mais doces que eu não sabia o nome. Música flutuava vinda de várias janelas, os sons suaves de liras e flautas de bambu.

Elevando-se no pico da montanha estava o mais grandioso palácio de todos, o reluzente salão branco dos deuses. Nossos pégasos nos deixaram no pátio externo, em frente a enormes portões de prata. Antes que eu sequer pensasse em bater, os portões se abriram por conta própria.

Boa sorte, chefe, Blackjack disse.

– É. – Não sabia por que, mas eu tinha uma sensação de condenação. Eu nunca tinha visto todos os deuses juntos. Sabia que qualquer um deles poderia me reduzir a pó, e alguns deles gostariam de fazê-lo.

Ei, se você não voltar, posso usar seu chalé como meu estábulo?

Olhei para o pégaso.

Só pensando, ele disse. Desculpe.

Blackjack e seus amigos voaram, deixando Thalia, Annabeth e eu sozinhos. Por um minuto nós ficamos lá observando o local, do jeito que ficamos juntos em frente ao Westover Hall, o que parecia ter acontecido há um milhão de anos. E então, lado a lado, entramos na sala do trono.

Doze enormes tronos faziam um U em volta da lareira central, como o posicionamento dos chalés no acampamento. O teto acima brilhava com constelações – até mesmo a mais nova, Zöe a Caçadora, fazendo seu caminho através dos céus com seu arco preparado.

Todos os assentos estavam ocupados. Cada deus e deusa tinha cerca de cinco metros, e eu te digo, se você alguma vez teve uma dúzia de indivíduos todo-poderosos e superenormes voltando seus olhos para você de uma vez... Bem, de repente, enfrentar monstros parecia um piquenique.

– Bem-vindos, heróis – Ártemis disse.

– Mooo!

Foi quando eu notei Bessie e Grover.

Uma esfera de água estava pairando no centro da sala, próxima à fogueira da lareira. Bessie estava nadando em volta alegre, balançando sua cauda de serpente e cutucando com a cabeça as laterais e o fundo da esfera. Ele parecia estar curtindo a novidade de nadar numa bolha mágica. Grover estava se ajoelhando perante o trono de Zeus, como se tivesse acabado de dar um relatório, mas quando nos viu, ele gritou:

– Vocês conseguiram!

Ele começou a correr em minha direção, então se lembrou que estava dando as costas para Zeus, e olhou pedindo permissão.

– Pode ir – Zeus disse. Mas ele não estava realmente prestando atenção em Grover. O lorde do céu estava encarando atentamente Thalia.

Grover trotou até mim. Nenhum dos deuses falou. Cada ruído dos cascos de Grover ecoava no piso de mármore. Bessie fazia estardalhaço em sua bolha de água. A fogueira central crepitava.

Olhei nervosamente para meu pai, Poseidon. Ele estava vestido de forma parecida com a última vez que eu o vira: bermuda de praia, uma camiseta havaiana e sandálias. Ele tinha o rosto ressecado e bronzeado com uma barba escura e profundos olhos verdes. Eu não tinha certeza de como ele se sentiria me vendo de novo, mas os cantos de seus olhos enrugaram com linhas de sorriso. Ele acenou com a cabeça como se fosse dizer Está tudo bem.

Grover deu grandes abraços em Annabeth e Thalia. Então ele agarrou meus braços.

– Percy, Bessie e eu conseguimos! Mas você tem que convencê-los! Eles não podem fazer isso!

– Fazer o quê? – perguntei.

– Heróis – Ártemis chamou.

A deusa deslizou de seu trono e adquiriu tamanho humano, uma jovem garota de cabelo castanho avermelhado, perfeitamente sossegada em meio aos gigantes Olimpianos. Ela andou em nossa direção, suas roupas prateadas cintilando. Não havia emoção em seu rosto. Ela parecia caminhar em uma coluna de luar.

– O Conselho foi informado dos seus feitos – Ártemis nos disse. – Eles sabem que o Monte Ótris está se erguendo no Oeste. Eles sabem da tentativa de libertação de Atlas, e dos exércitos reunidos de Cronos. Votamos por agir.

Houve um balbuciar e conversas confusas entre os deuses, como se eles não estivessem todos muito felizes com este plano, mas ninguém protestou.

– Ao comando de meu Lorde Zeus – Ártemis disse, – meu irmão Apolo e eu devemos caçar os mais poderosos monstros, buscando atacá-los antes que eles se unam à causa dos Titãs. Lady Atena deve checar pessoalmente os outros Titãs para ter certeza de que eles não escapem de suas diversas prisões. Lorde Poseidon obteve permissão para liberar toda sua fúria no navio de cruzeiro Princesa Andrômeda e mandá-lo para o fundo do mar. E quanto a vocês, meus heróis...

Ela se virou para encarar os outros imortais.

– Estes meio-sangues prestaram um ótimo serviço para o Olimpo. Alguém aqui negaria isso?

Ela olhou em volta para os deuses reunidos, encontrando as faces deles individualmente. Zeus em seu escuro terno risca de giz, sua barba preta impecavelmente aparada, e seus olhos faiscando com energia. Ao seu lado se sentava uma bela mulher com cabelo prateado trançado sobre um ombro e um vestido que cintilava cores parecidas com as das penas de pavão. A Lady Hera.

À direita de Zeus, meu pai Poseidon. Ao lado dele, uma grande massa que era um homem com a perna em um suporte de aço, uma cabeça disforme, uma selvagem barba castanha, fogo tremeluzindo através de suas suíças. O Lorde das Forjas, Hefesto.

Hermes piscou para mim. Ele estava vestindo um terno empresarial hoje, checando mensagens em seu celular caduceu. Apolo estava inclinado para trás em seu trono dourado usando seus óculos escuros. Ele estava usando fones de iPod, então eu não tinha certeza se ele ao menos estava escutando, mas ele levantou o polegar para mim.

Dioniso parecia entediado, enrolando uma vinha entre os dedos. E Ares, bem, ele estava sentado em seu trono de cromo e couro olhando ameaçadoramente para mim enquanto afiava uma faca.

No lado feminino da sala do trono, uma deusa de cabelos escuros em roupas verdes sentava-se ao lado de Hera em um trono tecido com ramos de macieira. Deméter, Deusa da Colheita. Ao lado dela se sentava uma bonita mulher de olhos cinzentos em um elegante vestido branco. Ela só podia ser a mãe de Annabeth, Atena. Então lá estava Afrodite, que sorria para mim de propósito e me fez enrubescer contra a minha vontade.

Todos os Olimpianos em um só lugar. Tanto poder nesta sala, era um milagre que o palácio inteiro não explodisse.

– Tenho que dizer – Apolo quebrou o silêncio, – essas crianças se saíram muito bem. – Ele pigarreou e começou a recitar: – Heróis ganham louros...

– Hum, sim, primeira classe – Hermes interrompeu, como se estivesse ansioso para evitar a poesia de Apolo. – Todos a favor de não desintegrá-los?

Algumas mãos subiram na tentativa – Deméter, Afrodite.

– Espere só um minuto – Ares rosnou. Ele apontou para Thalia e para mim. – Esses aí são perigosos. Seria muito mais seguro, enquanto temos os dois aqui...

– Ares – Poseidon interrompeu. – Eles são heróis notáveis. Não vamos explodir meu filho em pedaços.

– Nem minha filha – Zeus resmungou. – Ela se saiu bem.

Thalia corou. Ela estudou o chão. Eu sabia como ela se sentia. Eu quase nunca falava com meu pai, menos ainda ganhava um elogio.

A deusa Atena pigarreou e sentou mais a frente.

– Também estou orgulhosa de minha filha. Mas há um risco de segurança aqui com os outros dois.

– Mãe! – Annabeth disse. – Como você pode –

Atena a cortou com um olhar calmo, mas firme.

– É lamentável que meu pai, Zeus, e meu tio, Poseidon, tenham escolhido quebrar seu juramento de não ter mais filhos. Apenas Hades manteve sua palavra, um fato que acho irônico. Como nós sabemos pela Grande Profecia, crianças dos três deuses mais velhos... como Thalia e Percy... são perigosas. Mesmo sendo cabeça dura como ele é, Ares tem um argumento.

– Certo! – Ares disse. – Ei, espere um minuto. Quem você está chamando –

Ele começou a se levantar, mas uma videira cresceu ao redor de sua cintura como um cinto de segurança e o puxou de volta.

– Oh, por favor, Ares – Dioniso suspirou. – Poupe a briga para depois.

Ares praguejou e arrancou a videira.

– Você é quem deve falar, seu velho bêbado. Você seriamente quer proteger esses pirralhos?

Dioniso olhou para nós enfadonhamente.

– Não tenho amor por eles. Atena, você realmente pensa que é mais seguro destruí-los?

– Eu não faço o julgamento – Atena disse. – Apenas aponto o risco. O que nós faremos, o Conselho quem deve decidir.

– Eu não vou puni-los – Ártemis falou. – Vou recompensá-los. Se nós destruímos heróis que nos fazem um grande favor, então não somos melhores que os Titãs. Se esta é a justiça Olimpiana, não terei nada com ela.

– Calma, maninha – Apolo disse. – Céus, você precisa relaxar.

– Não me chame de maninha! Eu vou recompensá-los.

– Bem – Zeus resmungou. – Talvez. Mas pelo menos o monstro tem que ser destruído. Concordamos quanto a isso?

Um bocado de cabeças assentindo.

Levou um segundo para eu perceber do que eles estavam falando. Então meu coração se transformou em chumbo.

– Bessie? Vocês querem destruir Bessie?

– Mooooooo! – Bessie protestou.

Meu pai franziu a testa.

– Você deu o nome de Bessie para o Ofiotauro?

– Pai – eu disse, – ele é apenas uma criatura marinha. Uma criatura marinha realmente legal. Você não pode destruí-lo.

Poseidon mudou de posição, desconfortável.

– Percy, o poder do monstro é considerável. Se os Titãs o roubarem, ou –

– Vocês não podem – insisti. Olhei para Zeus. Eu provavelmente deveria estar com medo dele, mas encarei seus olhos diretamente. – Controlar profecias nunca funciona. Não é verdade? Além do mais Bess - o Ofiotauro é inocente. Matar algo desse jeito é errado. É tão errado quanto… Cronos comer seus filhos, apenas por causa de alguma coisa que eles poderiam fazer. É errado!

Zeus pareceu considerar isto. Seus olhos flutuaram para sua filha Thalia.

– E quanto ao risco? Cronos sabe muito bem, se um de vocês sacrificar as entranhas da fera, teria o poder para nos destruir. Você acha que nós podemos deixar essa possibilidade remanescer? Você, minha filha, vai fazer dezesseis anos amanhã, justamente como diz a profecia.

– Vocês têm que confiar neles – Annabeth falou. – Senhor, você tem que confiar neles.

Zeus franziu as sobrancelhas.

– Confiar em um herói?

– Annabeth está certa – Ártemis disse. – E é por isso que devo fazer primeiro a retribuição. Minha fiel companheira, Zöe Doce-Amarga, passou para as estrelas. Eu devo ter uma nova tenente. E eu pretendo escolher uma. Mas primeiro, Pai Zeus, devo falar com você em particular.

Zeus acenou para Ártemis vir à frente. Ele se inclinou e escutou enquanto ela falava em seu ouvido.

Um sentimento de pânico se apoderou de mim.

– Annabeth – eu disse em um sussurro. – Não.

Ela franziu a testa para mim.

– O quê?

– Olhe, eu preciso te contar uma coisa – continuei. As palavras vieram tropeçando para fora de mim. – Eu não conseguiria aguentar se... Não quero que você –

– Percy? – ela disse. – Parece que você vai passar mal.

E era assim que eu me sentia. Queria falar mais, mas minha língua me traiu. Ela não se movia por causa do medo em meu estômago. E então Ártemis se virou.

– Terei uma nova tenente – ela anunciou. – Se ela aceitar.

– Não – eu murmurei.

– Thalia – Ártemis disse. – Filha de Zeus. Você deseja se juntar às Caçadoras?

Um silêncio pasmo encheu a sala. Olhei fixamente para Thalia, incapaz de acreditar no que estava ouvindo. Annabeth sorriu. Ela apertou a mão de Thalia e depois a soltou, como se estivesse esperando por isso o tempo todo.

– Eu desejo – Thalia disse, firme.

Zeus se levantou, seus olhos cheios de preocupação.

– Minha filha, considere bem –

– Pai – ela disse. – Eu não vou fazer dezesseis amanhã. Nunca farei dezesseis. Não deixarei essa profecia ser minha. Eu fico com minha irmã Ártemis. Cronos nunca mais vai me tentar.

Ela se ajoelhou perante a deusa e iniciou as palavras que eu me lembrava do juramento de Bianca, o que parecia ter acontecido há tanto tempo.

– Eu me submeto à deusa Ártemis. Eu abandono a companhia dos homens...

Depois disso, Thalia fez algo que me surpreendeu quase tanto quanto o juramento. Ela veio até mim, sorriu, e na frente de toda a assembleia me deu um grande abraço.

Eu corei.

Quando ela se afastou e apertou meus ombros, eu disse:

– Hum... supostamente você não deveria não mais fazer isso? Abraçar garotos, quero dizer?

– Estou honrando um amigo – ela corrigiu. – Eu devo me juntar às Caçadoras, Percy. Eu não sei o que é paz desde... desde a Colina Meio-Sangue. Eu finalmente sinto que tenho um lar. Mas você é um herói. Você vai ser aquele da profecia.

– Ótimo – sussurrei.

– Estou orgulhosa de ser sua amiga.

Ela abraçou Annabeth, que estava tentando arduamente não chorar. Então ela até abraçou Grover, que parecia prestes a desmaiar, como se alguém tivesse dado a ele um cupom de tudo-o-que-você-puder-comer de enchiladas.

Então Thalia foi se postar ao lado de Ártemis.

– Agora quanto ao Ofiotauro – Ártemis disse.

– Este garoto ainda é perigoso – Dioniso alertou. – A fera é uma tentação para um grandioso poder. Mesmo se pouparmos o garoto –

– Não – olhei em volta para todos os deuses. – Por favor. Mantenham o Ofiotauro seguro. Meu pai pode escondê-lo em algum lugar no fundo do mar, ou mantê-lo num aquário aqui no Olimpo. Mas vocês têm que protegê-lo.

– E por que nós deveríamos confiar em você? – atirou Hefesto.

– Tenho apenas catorze anos – falei. – Se essa profecia é sobre mim, ainda tem mais dois anos.

– Dois anos para Cronos enganar você – Atena disse. – Muito pode mudar em dois anos, meu jovem herói.

– Mãe! – Annabeth disse, exasperada.

– É unicamente a verdade, criança. É uma estratégia ruim manter o animal vivo. Ou o garoto.

Meu pai se levantou.

– Não terei uma criatura marinha destruída, se eu puder ajudar. E eu posso ajudar.

Ele estendeu a mão, e um tridente apareceu nela: uma haste de bronze de seis metros de comprimento com três pontas de lança que cintilava com uma luz azul aquosa.

– Vou garantir pelo garoto e pela segurança do Ofiotauro.

– Você não vai levá-lo para o fundo do mar! – Zeus se levantou abruptamente. – Não deixarei esse tipo de moeda de troca em seu poder.

– Irmão, por favor – Poseidon suspirou.

O relâmpago de Zeus apareceu em sua mão, uma lança de eletricidade que encheu a sala inteira com o cheiro de ozônio.

– Está bem – Poseidon disse. – Construirei um aquário para a criatura aqui. Hefesto pode me ajudar. A criatura ficará segura. Nós devemos protegê-la com todos os nossos poderes. O garoto não nos trairá. Eu garanto isso por minha honra.

Zeus pensou sobre isso.

– Todos a favor?

Para minha surpresa, muitas mãos se levantaram. Dioniso se absteve. Assim como Ares e Atena. Mas todos os outros…

– Temos uma maioria – Zeus decretou. – E então, já que não vamos destruir esses heróis... Imagino que devemos homenageá-los. Que comece a celebração do triunfo!

Existem festas, e existem festas enormes, maiores e de arrasar. E então existem as festas Olimpianas. Se alguma vez você tiver escolha, vá para a Olimpiana.

As Nove Musas deram início às melodias, e percebi que a música era o que você queria que fosse: os deuses podiam escutar as clássicas e os jovens semideuses ouviam hip-hop ou qualquer outra coisa, e era tudo a mesma trilha sonora. Sem discussões. Sem brigas para mudar a estação de rádio. Apenas pedidos para aumentar o volume.

Dioniso andava em volta fazendo crescer do chão barracas de refrescos, e uma bela mulher caminhava com ele de braços dados – sua esposa, Ariadne. Dioniso parecia feliz pela primeira vez. Néctar e ambrosia transbordavam das fontes douradas, e travessas de petiscos mortais lotavam as mesas do banquete. Cálices de ouro cheios com qualquer bebida que você quisesse. Grover trotou por aí com um prato cheio de latas de alumínio e enchiladas, e seu cálice estava cheio de café expresso duplo com leite, sobre o qual ele continuava murmurando como um encantamento:

– Pan! Pan!

Deuses continuavam chegando para me parabenizar. Fiquei agradecido por eles terem se reduzido ao tamanho humano, assim eles não esmagavam acidentalmente os convidados debaixo de seus pés. Hermes começou a conversar comigo, e ele estava tão animado que eu odiava ter que contar a ele o que tinha acontecido com o seu filho menos favorito, Luke, mas antes que eu ao menos reunisse coragem, Hermes recebeu uma ligação em seu caduceu e foi embora.

Apolo me contou que eu poderia dirigir sua carruagem solar a qualquer hora, e se alguma vez eu quisesse aulas de arco e flecha, estaria a disposição.

– Obrigado – falei para ele. – Mas é sério, não sou nada bom no arco e flecha.

– Ah, bobagem – ele disse. – Treino com alvos enquanto voamos na carruagem sobre os Estados Unidos? Melhor diversão que existe!

Dei algumas desculpas e costurei pelos grupos que estavam dançando nos jardins do palácio. Estava procurando por Annabeth. Da última vez que a vi, ela estava dançando com algum deus menor.

Então uma voz masculina atrás de mim disse:

– Você não vai me desapontar, espero.

Eu me virei e achei Poseidon sorrindo para mim.

– Pai... oi.

– Olá, Percy. Você se saiu bem.

O elogio dele me deixou desconfortável. Quero dizer, eu me senti bem, mas sabia o quanto ele tinha se posto no limite, garantindo por mim. Teria sido muito mais fácil deixar os outros me desintegrarem.

– Não vou desapontar você – prometi.

Ele assentiu. Eu tinha problemas em ler as emoções dos deuses, mas imaginei se ele tinha algumas dúvidas.

– Seu amigo Luke...

– Ele não é meu amigo – eu disse abruptamente. Então percebi que provavelmente era rude interromper. – Desculpe.

– Seu ex-amigo Luke – corrigiu Poseidon. – Ele certa vez prometeu coisas assim. Ele era o orgulho e a alegria de Hermes. Apenas tenha isso em mente, Percy. Mesmo os mais valentes podem cair.

– Luke caiu pra valer – concordei. – Ele está morto.

Poseidon balançou a cabeça.

– Não, Percy. Ele não está.

Eu o encarei.

– O quê?

– Acredito que Annabeth lhe contou isso. Luke ainda vive. Eu vi. Seu barco parte de São Francisco com os restos de Cronos mesmo agora. Ele vai recuar e reagrupar antes de atacar você novamente. Vou fazer o máximo para destruir o barco dele com tempestades, mas ele está fazendo alianças com meus inimigos, os antigos espíritos do oceano. Eles vão lutar para protegê-lo.

– Como ele pode estar vivo? – falei. – Com aquela queda ele deveria estar morto!

Poseidon pareceu incomodado.

– Eu não sei, Percy, mas tenha cuidado com ele. Ele está mais perigoso do que nunca. E o caixão dourado ainda está com ele, ainda ganhando força.

– E quanto ao Atlas? – eu disse. – O que existe para evitar que ele escape de novo? Ele não poderia apenas forçar algum gigante ou algo do tipo a carregar o céu por ele?

Meu pai bufou de escárnio.

– Se fosse tão fácil, ele já teria escapado há muito tempo. Não, meu filho. A maldição do céu só pode ser forçada sobre um Titã, uma das crianças de Gaia e Urano. Qualquer outra pessoa deve escolher levar o fardo por sua própria e livre vontade. Somente um herói, alguém com força, um coração verdadeiro, e grande coragem, faria tal coisa. Ninguém no exército de Cronos se arriscaria a tentar carregar esse peso, mesmo sob pena de morte.

– Luke conseguiu – eu disse. – Ele libertou Atlas. Então ele iludiu Annabeth para salvá-lo e a usou para convencer Ártemis a carregar o céu.

– Sim – Poseidon disse. – Luke é... um caso interessante.

Acho que ele queria falar mais, mas bem nesse momento, Bessie começou a mugir do outro lado do jardim. Alguns semideuses estavam brincando com sua esfera de água, alegremente empurrando para frente e para trás por cima da multidão.

– É melhor eu cuidar disso – Poseidon resmungou. – Não podemos deixar o Ofiotauro ser arremessado por aí como uma bola de praia. Fique bem, meu filho. Não devemos nos falar de novo por algum tempo.

E desse jeito ele se foi.

Estava prestes a continuar procurando pela multidão quando outra voz falou.

– Seu pai corre um grande risco, sabe.

Eu me encontrei frente a frente com uma mulher de olhos cinzentos que se parecia tanto com Annabeth que quase a chamei assim.

– Atena – tentei não soar ressentido, depois da forma como ela me descartara no conselho, mas acho que não escondi muito bem.

Ela sorriu secamente.

– Não me julgue tão rigorosamente, meio-sangue. Sábios conselhos não são sempre populares, mas falo a verdade. Você é perigoso.

– Você nunca corre riscos?

Ela assentiu.

– Eu admito o argumento. Talvez você seja útil. E ainda... seu defeito mortal pode nos destruir tanto quanto a você mesmo.

Meu coração foi parar na minha garganta. Um ano atrás, Annabeth e eu tivemos uma conversa sobre defeitos mortais. Todo herói tinha um. O dela, ela disse, era orgulho. Ela acreditava que podia fazer qualquer coisa... como carregar o mundo, por exemplo. Ou salvar Luke. Mas eu realmente não sabia qual era o meu. Atena quase pareceu pesarosa por mim.

– Cronos conhece o seu defeito, mesmo que você não. Ele sabe como estudar seus inimigos. Pense, Percy. Como ele manipulou você? Primeiro, sua mãe foi tirada de você. Depois seu melhor amigo, Grover. Agora minha filha, Annabeth. – Ela parou, reprovando. – Em cada caso, aqueles que você ama foram usados para fisgar você em uma das armadilhas de Cronos. Seu defeito mortal é a lealdade pessoal, Percy. Você não sabe quando é hora de cortar suas perdas. Para salvar um amigo, você sacrificaria o mundo. No herói da profecia, isso é muito, muito perigoso.

Cerrei meus punhos.

– Isso não é um defeito. Só porque eu quero ajudar meus amigos...

– Os defeitos mais perigosos são aqueles bons com moderação – ela disse. – O mal é fácil de combater. A falta de sabedoria... isso é muito difícil, certamente.

Eu quis argumentar, mas descobri que não conseguiria. Atena era inteligente demais.

– Espero que a decisão do Conselho se prove sábia – Atena disse. – Mas estarei vigiando, Percy Jackson. Não aprovo sua amizade com a minha filha. Não acho sábio para nenhum dos dois. E você deveria começar a vacilar em suas lealdades...

Ela fixou em mim seu olhar frio e cinza, e percebi que terrível inimiga Atena seria, dez vezes pior que Ares ou Dioniso ou talvez até meu pai. Atena nunca desistiria. Ela nunca faria algo precipitado ou estúpido somente porque te odiava, e se ela fizesse um plano para te destruir, ele não falharia.

– Percy! – Annabeth disse, correndo através da multidão. Ela parou abruptamente quando viu com quem eu estava falando. – Oh... Mãe.

– Vou deixar vocês – Atena disse. – Por agora.

Ela se virou e caminhou pelo meio da multidão, que se repartia diante dela como se ela estivesse carregando Aegis.

– Ela estava sendo difícil com você? – Annabeth perguntou.

– Não – falei. – Está... tudo bem.

Ela me estudou com preocupação. Ela tocou a nova mecha cinza em meu cabelo que combinava exatamente com a dela – nossa dolorosa lembrança por ter carregado o fardo de Atlas. Havia muito que eu queria falar para Annabeth, mas Atena tirara a confiança de mim. Senti como se tivesse levado um soco no estômago.

Não aprovo sua amizade com a minha filha.

– Então – Annabeth disse. – O que você queria me falar mais cedo?

A música estava tocando. Pessoas estavam dançando nas ruas. Eu disse:

– Eu, hã, estava pensando que fomos interrompidos em Westover Hall. E… acho que lhe devo uma dança.

Ela sorriu vagarosamente.

– Tudo bem, Cabeça de Alga.

Então peguei a mão dela, e não sei o que todo o resto ouvia, mas para mim soava como uma música lenta: um pouco triste, mas talvez um pouco esperançosa, também.

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