quinta-feira, 17 de outubro de 2013

XXI - Leo






DEPOIS DE INVADIR UM MUSEU CHEIO de fantasmas confederados, Leo não acreditava que seu dia poderia ficar pior. Ele estava errado.
Não tinham encontrado nada na seção de Guerra Civil ou em outras partes do museu; apenas alguns turistas idosos e um guarda de segurança cochilando. Quando tentaram inspecionar os artefatos, um batalhão inteiro de caras zumbis brilhantes em uniformes cinza apareceu.
A ideia de que Frank deveria ser capaz de controlar os espíritos? Sim... A ideia falhou completamente. Quando Piper mandou a mensagem de Íris alertando-os sobre o ataque romano, eles já estavam a meio caminho do navio, depois de terem sido perseguidos pelo centro de Charleston por um bando de confederados mortos raivosos.
Então – ah,cara! – Leo teve que pegar uma carona com Frank, a Águia Amigável, para que eles pudessem lutar contra um bando de romanos. A fofoca de que foi Leo quem tinha disparado em sua pequena cidade deve ter se espalhado, porque os romanos pareciam especialmente ansiosos para matá-lo. Mas espere! Tem mais! O Treinador Hedge atirou-os pelo céu; Frank o derrubou (isso não foi um acidente) e eles pousaram em Fort Sumter.
Agora, enquanto Argo II corria através das ondas, Leo teve que usar toda a sua habilidade apenas para manter o navio inteiro. Percy e Jason foram um pouco bons demais em criar tempestades maciças.
Nesse momento, Annabeth estava ao lado dele, gritando contra o rugido do vento:
— Percy diz que conversou com uma Nereida no porto de Charleston!
— Bom para ele! — Leo gritou de volta.
— A Nereida disse que devemos procurar ajuda com os irmãos de Quíron.
— O que significa isso? São os Pôneis de Festa?
Leo nunca conheceu os parentes loucos de Quíron, mas tinha ouvido rumores de lutas de espada de brinquedo, torcidas organizadas para concursos de cerveja e superchuvarada de chantilly pressurizado.
— Não tenho certeza — disse Annabeth. — Mas tenho as coordenadas. Você pode colocar latitude e longitude nessa coisa?
— Eu posso tabular gráficos de estrelas e te encomendar uma batida se você quiser. É claro que eu posso coordenar latitude e longitude!
Annabeth calculou e mostrou os números. Leo de alguma forma conseguiu colocá-los na máquina, mantendo o volante com uma mão. Um ponto vermelho apareceu na tela de bronze.
— Essa localização é no meio do Atlântico — disse ele. — Será que os Pôneis de Festa têm um iate?
Annabeth encolheu os ombros sem saber responder.
— Basta segurar o navio inteiro até estarmos mais longe de Charleston. Jason e Percy vão manter os ventos!
— Hora da diversão!
Depois do que pareceu ser sempre, finalmente o mar se acalmou e os ventos morreram.
— Valdez — disse o Treinador Hedge com surpreendente suavidade. — Deixe-me pegar o leme. Você tem dirigido por duas horas.
— Duas horas?
— É. Me passe o leme.
— Treinador?
— Sim, garoto?
— Eu não posso abrir minhas mãos.
Era verdade. Os dedos de Leo pareciam que tinham petrificado. Seus olhos ardiam de ficar olhando para o horizonte. Seus joelhos eram marshmallows. O Treinador Hedge conseguiu arrancá-lo do leme.
Leo deu uma última olhada no controle, ouvindo o zumbido de Festus passando o relatório de status. Leo sentiu que estava esquecendo alguma coisa. Ele olhou para os controles, tentando pensar, mas não adiantou.
Seus olhos mal podiam se concentrar.
— Apenas tenha cuidado com os monstros — disse ao treinador. — E cuidado com o estabilizador danificado. E...
— Eu já entendi, tudo sob controle — prometeu o treinador Hedge. — Agora, vá embora!
Leo balançou a cabeça cansado. Ele cambaleou pela plataforma até encontrar seus amigos.
Percy e Jason estavam sentados com as costas contra o mastro, as cabeças pendendo em exaustão. Annabeth e Piper estavam tentando fazê-los beber um pouco de água. Hazel e Frank estavam fora do alcance da voz, tendo uma discussão que envolvia muito aceno de braços e cabeças balançando. Leo não devia se sentir satisfeito com isso, mas parte dele estava. A outra parte dele se sentia mal por se sentir satisfeito.
A discussão parou abruptamente quando Hazel viu Leo. Todos se reuniram no mastro.
Frank fez uma careta, como se estivesse se esforçando para se transformar em um buldogue.
— Nenhum sinal de perseguição — disse ele.
— Ou de terra — Hazel acrescentou.
Ela parecia um pouco verde, mas Leo não tinha certeza se era do balanço do barco ou da discussão.
Leo esquadrinhou o horizonte. Nada além de mar em todas as direções. Isso não deveria ter surpreendido- o. Ele passou seis meses construindo uma nave que sabia que iria atravessar o Atlântico. Mas até hoje, seu embarque em uma viagem para as terras antigas não parecia real. Leo nunca tinha estado fora dos EUA antes, exceto por um rápido voo de dragão até Quebec. Agora eles estavam no meio do mar aberto, completamente por conta própria, navegando para o Mar Mediterrâneo, o lugar de onde todos os monstros assustadores e gigantes desagradáveis tinham vindo.
Os romanos não os seguiriam aqui, mas eles também não poderiam contar com qualquer ajuda do Acampamento Meio-Sangue.
Leo deu um tapinha na cintura para se certificar de que seu cinto de ferramentas ainda estava lá. Infelizmente isso só o lembrou do biscoito da sorte de Nêmesis, escondido dentro de um dos bolsos.
Você será sempre o estranho. A voz da deusa ainda se contorcia em sua cabeça. A sétima roda.
Esqueça isso, Leo disse a si mesmo. Concentre-se nas coisas que você pode consertar. Ele se virou para Annabeth.
— Você achou o mapa que queria?
Ela assentiu com a cabeça, embora estivesse pálida. Leo se perguntou o que ela tinha visto em Fort Sumter que poderia tê-la afetado desse jeito.
— Vou ter que estudar isso — disse ela como se fosse o fim do assunto. — Quão longe estamos daquelas coordenadas?
— Com a velocidade máxima dos remos, cerca de uma hora. Alguma ideia do que estamos procurando?
— Não — ela admitiu. — Percy?
Percy levantou a cabeça. Seus olhos verdes estavam vermelhos e cabisbaixos.
— A Nereida disse que os irmãos de Quíron estavam lá e que eles devem querer ouvir falar do aquário em Atlanta. Eu não sei o que ela quis dizer, mas... — ele fez uma pausa como se tivesse usado toda a energia dele só dizendo aquilo — também me alertou para ter cuidado. Ceto, a deusa no aquário: ela é a mãe dos monstros do mar. Pode estar presa em Atlanta, mas ainda pode enviar seus filhos atrás de nós. A Nereida disse que devemos esperar um ataque.
— Maravilhoso — Frank murmurou.
Jason tentou se levantar, o que não foi uma boa ideia. Piper agarrou-o para impedi-lo de cair e ele deslizou de volta para baixo.
— Podemos colocar o navio no alto? — questionou. — Se pudéssemos voar...
— Isso seria ótimo — Leo falou — exceto que Festus me diz que o estabilizador da porta aérea foi pulverizado quando o navio bateu contra o cais em Fort Sumter.
— Nós estávamos com pressa — Annabeth disse. — Tentando te salvar.
— E me salvar é uma causa muito nobre — Leo concordou. — Eu só estou dizendo que vai levar algum tempo para consertar. Até então não vamos voar para nenhum lugar.
Percy flexionou os ombros e fez uma careta.
— Por mim tudo bem. No mar está bom.
— Fale por você — Hazel olhou para o sol da tarde, que estava quase no horizonte. — Precisamos ir mais rápido. Nós queimamos outro dia e Nico tem apenas mais três sementes restantes.
— Nós podemos fazer isso — prometeu Leo. Esperava que Hazel o tivesse perdoado por não confiar em seu irmão (hey, parecia uma suspeita razoável para Leo), mas ele não queria reabrir essa ferida. — Nós podemos chegar a Roma em três dias assumindo que nada, você sabe, inesperado aconteça.
Frank resmungou. Parecia que ele ainda estava trabalhando na transformação para buldogue.
— Tem alguma notícia boa?
— Na verdade, sim. De acordo com Festus, nossa mesa voadora, Buford, conseguiu voltar em segurança enquanto estávamos em Charleston, então aquelas águias não conseguiram pegá-lo. Infelizmente ele perdeu o saco de roupas com suas calças.
— Que saco — Frank latiu e Leo percebeu que isso era provavelmente um grande palavrão para ele.
Sem dúvida, Frank teria xingado mais – liberando alguns “carambolas” e “é foca viu”, mas Percy interrompeu, dobrando o corpo e gemendo.
— Será que o mundo acabou de virar de cabeça para baixo? — questionou.
Jason apertou as mãos na cabeça.
— Sim, e ele está girando. Tudo é amarelo. Deveria ser amarelo?
Annabeth e Piper trocaram olhares preocupados.
— Invocar aquela tempestade realmente minou suas forças — Piper disse aos meninos. — Vocês têm que descansar.
Annabeth assentiu com a cabeça.
— Frank, você pode nos ajudar a levá-los para os quartos?
Frank olhou para Leo, sem dúvida relutante em deixá-lo sozinho com Hazel.
— Tá tudo bem, cara — Leo falou. — Só tente não deixá-los cair pelo caminho enquanto desce as escadas.
Uma vez que os outros estavam lá embaixo, Hazel e Leo se olharam sem jeito. Eles estavam sozinhos tirando o Treinador Hedge, que estava de volta ao tombadilho cantando a música tema de Pokémon. O Treinador mudou as palavras para: Temos que matar, temos que matar e Leo realmente não queria saber por quê.
A música não estava ajudando com a náusea de Hazel.
— Ugh... — ela se inclinou e se abraçou.
Ela tinha um cabelo legal, crespo e castanho como cachos de canela. Seu cabelo lembrou Leo de um lugar em Houston que faz churros excelentes. Esse pensamento o fez ficar com fome.
— Não se incline mais — ele aconselhou. — Não feche seus olhos. Isso torna o mal-estar pior.
— É mesmo? Você enjoa também?
— Não fico enjoado no mar, mas carros me dão náuseas, e...
Ele parou. Ele queria dizer falar com meninas, mas ele decidiu manter isso para si.
— Carros? — Hazel se endireitou com dificuldade. — Você pode navegar num navio ou voar num dragão, mas carros te deixam enjoado?
— Eu sei, estranho, né? — Leo deu de ombros. — Eu sou especial assim. Olha, mantenha os olhos no horizonte. É um ponto fixo. Isso vai ajudar.
Hazel respirou fundo e olhou para o horizonte. Seus olhos eram de um ouro brilhante, como os discos de bronze e cobre dentro da cabeça mecânica de Festus.
— Melhorou?
— Talvez um pouco — parecia que ela estava apenas sendo educada.
Ela manteve os olhos no horizonte, mas Leo teve a sensação de que ela estava observando seu jeito, considerando o que dizer.
— Frank não te deixou cair de propósito. Ele não é assim. É apenas um pouco desajeitado, às vezes.
— Oops — Leo disse, em sua melhor voz Frank Zhang. — Leo caiu em um esquadrão de soldados inimigos. Que saco!
Hazel tentou suprimir um sorriso. Leo pensou que "sorrindo" era melhor do que "vomitando".
— Tenha paciência com ele — disse Hazel. — Você e suas bolas de fogo deixam Frank nervoso.
— O cara pode se transformar em um elefante, e eu deixo ele nervoso?
Hazel manteve os olhos no horizonte. Ela não parecia tão enjoada, apesar do fato de que o Treinador Hedge ainda estava no leme cantando a canção do Pokémon.
— Leo, sobre o que aconteceu no Great Salt Lake...
Lá vem, pensou Leo. Ele se lembrou de seu encontro com a deusa da vingança Nêmesis. O biscoito da sorte em seu cinto de ferramentas começou a ficar mais pesado. Ontem à noite, enquanto fugiam voando de Atlanta, Leo tinha ficado em sua cabine e pensou em como tinha deixado Hazel com raiva. Tinha pensado em maneiras de consertar isso.
Logo enfrentará um problema que não pode resolver, Nêmesis tinha dito, mas eu posso ajudá-lo... por um preço.
Leo tinha pego o biscoito da sorte de seu cinto de ferramentas e o virado em seus dedos, imaginando qual o preço que teria de pagar se ele o abrisse.
Talvez agora fosse o momento.
— Eu estaria disposto — disse a Hazel. — eu poderia usar o biscoito da sorte para encontrar o seu irmão.
Hazel parecia atordoada.
— O quê? Não! Quer dizer... Eu nunca te pediria para fazer isso. Não depois do que Nêmesis disse sobre o preço terrível. Nós mal nos conhecemos!
A parte mal nos conhecemos meio que doeu, embora Leo soubesse que era verdade.
— Então... Não é isso que você queria falar? — perguntou ele. — Uh, você quer falar sobre o momento segurando-as-mãos-no-cais ? Porque...
— Não — ela interrompeu rapidamente, abanando o rosto dessa forma fofa que ela faz quando está nervosa. — Não, eu só estava pensando sobre a maneira que você enganou Narciso e as ninfas...
— Ah, certo — Leo olhou conscientemente em seu braço. A tatuagem COISA GOSTOSA ainda não tinha desbotado completamente. — Pareceu uma boa ideia na hora.
— Você foi incrível. Eu estive pensando sobre isso, o quanto você me faz lembrar do...
— Sammy — Leo adivinhou — eu gostaria que você me dissesse quem ele é.
— Quem ele era — Hazel corrigiu. O ar da noite estava quente, mas ela tremeu. — Eu estive pensando... Eu seria capaz de mostrar.
— Você quer dizer, como uma foto?
— Não. É uma espécie de flashback que acontece comigo. Eu não tenho um faz tempo e nunca tentei fazer acontecer de propósito. Mas compartilhei uma vez com Frank, então pensei...
Os olhos de Hazel encontraram-se com os dele. Leo começou a se sentir inquieto, como se tivessem injetado café em seu corpo. Se esse tal flashback era algo que Frank tinha compartilhado com Hazel... Bem, ou Leo não queria nada com isso ou ele definitivamente queria tentar. Ele não tinha certeza de qual.
— Quando você diz de flashback... — ele engoliu em seco. — O que exatamente estamos falando? É seguro?
Hazel estendeu-lhe a mão.
— Eu não gostaria de lhe pedir para fazer isso, mas tenho certeza que é importante. Não pode ser uma coincidência. Se isso funcionar, talvez possamos finalmente entender como estamos conectados.
Leo olhou para trás. Ele ainda tinha uma suspeita incômoda de que tinha esquecido alguma coisa, mas o Treinador Hedge parecia estar indo bem. O céu estava claro à frente. Não havia nenhum sinal de problemas.
Além disso, um flashback soava como uma coisa muito breve. Não ia fazer mal deixar o Treinador no comando por mais alguns minutos, não é?
— Tudo bem — ele cedeu. — Me mostre.
Ele pegou a mão de Hazel e o mundo dissolveu.


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