quinta-feira, 17 de outubro de 2013

XXV - Piper







PIPER TINHA UM NOVO ITEM em seu top 10 de Quantas vezes Piper se sentiu inútil. Lutar contra um camarão gigante com uma adaga e uma voz bonita? Não é tão eficaz. O monstro tinha afundado e desaparecido junto com três de seus amigos e ela tinha sido incapaz de ajudá-los.
Depois disso, Annabeth, o treinador Hedge e Buford ficaram em torno da mesa apressadamente reparando as coisas para que o navio não afundasse. Percy, apesar de estar exausto, procurava no oceano por seus amigos desaparecidos. Jason, também esgotado, voava ao redor da embarcação como um Peter-Pan loiro apagando os focos de incêndio da segunda explosão verde que havia iluminado o céu acima do mastro principal.
Quanto à Piper, tudo o que podia fazer era ficar olhando para sua faca Katoptris, tentando localizar Leo, Hazel e Frank. Mas as únicas imagens que vieram a ela eram as que não queria ver: três SUV‘s pretos conduzindo ao norte de Charleston, repletos de semideuses romanos e com Reyna sentada ao volante do carro que ia a frente. Águias gigantes os escoltavam do alto. Vários espíritos roxos brilhantes, em carros fantasmas, apareciam e desapareciam fora do campo trás deles, trovejando pela rodovia I-95 em direção a Nova York e ao Acampamento Meio-Sangue.
Piper se concentrou mais. Ela viu as imagens do pesadelo que havia tido antes: a cabeça meio humana e meio touro saindo da água, em seguida, um lugar muito escuro onde Jason, Percy e ela lutavam para se manter a tona da água negra que preenchia tudo. Ela embainhou Katoptris, imaginando como Helena tinha conseguido ficar sã durante a Guerra de Tróia, se esta lâmina havia sido sua única fonte de notícias. Então lembrou-se de que todos em torno de Helena tinham sido abatidos pelo exército invasor grego. Talvez ela não tivesse ficado sã.
Quando o sol se levantou, nenhum deles havia dormido. Percy vasculhara o fundo do mar e não conseguiu encontrar nada. O Argo II não estava mais em perigo de afundar, embora sem Leo eles não pudessem fazer todos os reparos. O navio era capaz de velejar, mas ninguém sugeriu deixar a área, não sem seus amigos desaparecidos.
Piper e Annabeth enviaram uma mensagem de Íris para o Acampamento Meio-Sangue, advertindo Quíron sobre o que havia acontecido com os romanos em Fort Sumter. Annabeth falou sobre a sua conversa com Reyna e Piper contou sobre o que havia visto em sua adaga, acerca das SUV‘s ao norte. O centauro de rosto gentil, que parecia ter 30 anos, no decorrer da conversa assegurou-lhes que iria rever as defesas do acampamento. Tyson, a Sra. O'Leary e Ella haviam chegado em segurança e, se necessário, Tyson poderia convocar um exército de ciclopes para a defesa do acampamento. Ella e Rachel Dare já estavam comparando profecias, tentando aprender mais sobre o que o futuro resguardava.
O trabalho dos sete semideuses a bordo do Argo II, Quíron as lembrou, era terminar a missão e voltar com segurança.
Após a mensagem de Íris, os semideuses passeavam pelo convés em silêncio, olhando para a água e esperando por um milagre.
Quando o milagre finalmente chegou, três grandes bolhas rosa estourando na superfície a estibordo ejetando Frank, Hazel e Leo, Piper ficou um pouco louca. Ela exclamou aliviada e mergulhou direto para a água.
O que ela estava pensando? Ela não pegou uma corda ou um colete salva-vidas ou qualquer coisa. Mas, no momento, estava tão feliz que nadou até Leo e beijou-o no rosto, o que o surpreendeu.
— Saudades de mim? — Leo riu.
Piper ficou furiosa de repente.
— Onde você estava? Como vocês estão vivos?
— É uma longa história — ele respondeu. Uma cesta de piquenique surgiu na superfície ao lado dele. — Quer um brownie?
Uma vez que eles estavam a bordo e colocaram roupas secas (o pobre Frank teve que pedir emprestado um par de calças de Jason, e elas eram pequenas para ele) a tripulação se reuniu no convés superior para um café-da-manhã em clima de comemoração, menos o treinador Hedge, que reclamou que a atmosfera estava ficando muito fofinha para seu gosto e desceu para arrumar algumas rachaduras no casco.
Enquanto Leo fuçava seu controle de leme, Hazel e Frank relataram a história dos peixes-centauros e seu campo de treinamento.
— Incrível — disse Jason. — Estes brownies de chocolate são muito bons.
— Esse é o seu único comentário? — Piper exigiu.
Ele pareceu surpreso.
— O quê? Eu ouvi a história. Peixes-centauros. Sereianos. Carta para o deus do Rio Tibre. Entendi. Mas esses biscoitos...
— Eu sei — disse Frank, com a boca cheia. — Prove-os com as conservas de pêssego de Esther.
— Isto — Hazel disse — é incrivelmente nojento.
— Me passe o vidro, cara — Jason pediu.
Hazel e Piper trocaram um olhar de total exasperação. Meninos.
Percy, por sua vez, queria ouvir todos os detalhes sobre o acampamento aquático. Ele sempre voltava ao mesmo ponto:
— Eles não querem me conhecer?
— Não foi isso — Hazel respondeu — é só... Política submarina, eu acho. O sereianos são territoriais. A boa notícia é que eles irão cuidar do aquário em Atlanta. E eles vão ajudar a proteger o Argo II para atravessar o Atlântico.
Percy assentiu distraidamente.
— Mas eles não querem se encontrar comigo?
Annabeth lhe deu um tapa no braço.
— Vamos, Cabeça de Alga! Temos outras coisas para nos preocupar.
— Ela está certa — Hazel concordou. — Depois de hoje, Nico tem menos de dois dias. Os peixes-centauros disseram que temos que resgatá-lo. Ele é essencial para a missão de alguma forma.
Ela olhou ao redor na defensiva, como se esperasse que alguém rebatesse. Mas ninguém o fez. Piper tentou imaginar o que Nico di Angelo estava sentindo, preso em um jarro restando apenas duas sementes de romã para mantê-lo vivo e sem nenhuma ideia se ele seria resgatado. Isso fez Piper ficar ansiosa para chegar a Roma, embora ela tivesse uma sensação horrível de que estava navegando em direção a uma espécie de prisão, uma sala escura cheia de água.
— Nico deve ter informações sobre as Portas da Morte — Piper disse. — Nós iremos salvá-lo, Hazel. Nós podemos fazer isso a tempo. Certo, Leo?
— O que? — Leo desviou os olhos dos controles. — Oh, sim. Devemos chegar no Mediterrâneo amanhã de manhã. Então, passaremos o resto do dia navegando em direção a Roma, ou voando, se eu pelo menos puder manter fixo o estabilizador e então...
Jason achou de repente que o seu brownie com conservas de pêssego não tinha mais um gosto tão bom.
— O que vai nos colocar em Roma no último dia possível para Nico. Vinte e quatro horas para encontrá-lo... No máximo.
Percy cruzou as pernas.
— E isso é apenas parte do problema. Há a Marca de Atena, também.
Annabeth não parecia feliz com a mudança de assunto. Ela descansou a mão em sua mochila, que, desde que eles deixaram Charleston, sempre parecia ter com ela. Ela abriu a bolsa e tirou um fino disco de bronze do diâmetro de um donut.
— Este é o mapa que eu encontrei em Fort Sumter. Ele é... — ela parou abruptamente, olhando para a superfície lisa de bronze. — Está em branco!
Percy pegou e analisou ambos os lados.
— Ele não era assim antes?
— Não! Eu estava olhando na minha cabine e... — Annabeth murmurou baixinho. — Deve ser como a Marca de Atena. Eu só posso ver quando estou sozinha. Não vai se mostrar a outros semideuses.
Frank recuou como se o disco pudesse explodir. Ele tinha um bigode de suco de laranja e uma barba de migalhas do brownie, o que fez Piper querer dar a ele um guardanapo.
— O que tem nele? — Frank perguntou nervosamente. — E o que é a Marca de Atena? Eu ainda não entendi.
Annabeth pegou o disco de Percy. Ela virou-o na luz do sol, mas ele permaneceu em branco.
— O mapa era difícil de ler, mas havia um local marcado no rio Tibre, em Roma. Eu acho que é onde minha busca começa... O caminho que eu tenho que fazer para seguir a Marca.
— Talvez isto seja onde você vai encontrar o deus do rio Tibre — disse Piper. — Mas o que é a Marca?
— A moeda — Annabeth murmurou.
Percy franziu a testa.
— Que moeda?
Annabeth colocou a mão em seu bolso e tirou um dracma de prata.
— Eu tenho carregado isso desde que vi a minha mãe na Grande Estação Central. É uma moeda ateniense.
A moeda passou por todos. Enquanto cada semideus analisava a moeda, Piper teve uma ridícula lembrança de uma brincadeira da escola primária.
— Uma coruja — Leo observou. — Bem, isso faz sentido. Eu acho que o ramo é um ramo de oliveira? Mas o que é essa inscrição, ΑΘΕ, área de efeito?
— É alfa, theta, épsilon — Annabeth disse. — Em grego, significa Dos atenienses... ou você poderia lê-lo como Os filhos de Atena. É uma espécie de lema ateniense.
— Como SPQR para os romanos — Piper adivinhou.
Annabeth assentiu.
— De qualquer forma, a Marca de Atena é uma coruja. Ela aparece em vermelho chamejante. Eu já vi isso em meus sonhos. E duas vezes em Fort Sumter.
Ela descreveu o que tinha acontecido no forte, a voz de Gaia, as aranhas na guarnição, a Marca queimando-as. Piper poderia dizer que não foi fácil para Annabeth falar sobre isso.
Percy pegou a mão de Annabeth.
— Eu deveria ter estado lá com você.
— Mas esse é o ponto — Annabeth falou. — Ninguém pode estar lá comigo. Quando eu chegar a Roma, tenho que estar lá por conta própria. Caso contrário, a Marca não vai aparecer. Eu vou ter que segui-la para... para a origem.
Frank pegou a moeda de Leo. Ele olhou para a coruja.
— A ruína dos gigantes se apresenta dourada e pálida. Conquistada por meio da dor de uma prisão tecida — ele olhou para Annabeth. — O que é isso... Essa coisa na origem?
Antes que Annabeth pudesse responder, Jason falou.
— Uma estátua. Uma estátua de Atena. Pelo menos... Esse é o meu palpite.
Piper franziu a testa.
— Você disse que não sabia.
— Eu não sei. Mas quanto mais penso sobre isso... Há apenas um artefato que poderia se encaixar na lenda — ele virou para Annabeth. — Me desculpe. Eu deveria ter dito tudo o que ouvi muito antes. Mas honestamente, eu estava com medo. Se esta lenda é verdadeira...
— Eu sei — disse Annabeth. — Eu percebi isso, Jason. Eu não culpo você. Mas se conseguirmos salvar a estátua, gregos e romanos juntos... Você não vê? Ela poderia diminuir a distância.
— Espere um pouco — Percy fez um gesto pedindo tempo — que estátua?
Annabeth colocou novamente a moeda de prata no bolso.
— A Atena Partenos. A mais famosa estátua grega de todos os tempos. Tinha doze metros de altura, coberta de marfim e ouro. Ficava no meio do Parthenon, em Atenas.
O navio ficou em silêncio, exceto pelo som da batida das ondas contra o casco.
— Ok, eu vou arriscar — Leo disse por fim. — O que aconteceu com ela?
— Ela desapareceu — Annabeth respondeu.
Leo franziu o cenho.
— Como uma estátua de doze metros de altura que estava no meio do Parthenon simplesmente desapareceu?
— Essa é uma boa pergunta — Annabeth concordou. — É um dos maiores mistérios da história. Algumas pessoas pensam que a estátua foi derretida por causa do ouro, ou destruída por invasores. Atenas foi saqueada um monte de vezes. Outros pensam que a estátua foi levada...
— Pelos romanos — Jason terminou. — Pelo menos, esta é uma teoria, uma lenda que eu ouvi no Acampamento Júpiter. Para quebrar o espírito dos gregos, os romanos retiraram a Atena Partenos quando tomaram a cidade de Atenas. Eles a esconderam em um santuário subterrâneo, em Roma. Os semideuses romanos juraram que nunca mais veria a luz do dia. Eles literalmente roubaram Atena, para que ela não pudesse mais ser o símbolo do poder militar grego. Ela tornou-se Minerva, uma deusa muito dominadora.
— E os filhos de Atena têm procurado a estátua desde então — Annabeth continuou. — A maioria não sabe sobre a lenda, mas em cada geração, alguns são escolhidos pela deusa. A eles é dada uma moeda como a minha e devem seguir a Marca de Atena... Uma espécie de trilha mágica que os liga a estátua... Na esperança de encontrar o lugar onde está a Atena Partenos e conseguir a estátua de volta.
Piper olhou os dois – Annabeth e Jason – com um espanto silencioso. Eles falaram como uma equipe, sem qualquer hostilidade ou acusação. Os dois nunca haviam realmente confiado um no outro. Piper estava perto o suficiente dos dois para saber isso. Mas agora... Se eles podiam discutir esse grande problema tão calmamente – a maior fonte do ódio entre os gregos e os romanos – talvez houvesse esperança para os dois acampamentos, apesar de tudo.
Percy parecia estar tendo pensamentos semelhantes, a julgar pela sua expressão de surpresa.
— Então se nós... quero dizer, você, encontrar a estátua, o que devemos fazer com ela? Poderíamos mesmo movê-la?
— Eu não tenho certeza — Annabeth admitiu — mas se pudermos salvá-la de alguma forma, isso poderia unir os dois acampamentos. Ela poderia curar minha mãe desse ódio que ela tem, dilacerando seus dois aspectos separados. E talvez... Talvez a estátua tenha algum tipo de poder que poderia nos ajudar contra os gigantes.
Piper olhou para Annabeth com temor, começando a se admirar da enorme responsabilidade que sua amiga estava assumindo. E Annabeth escolheu fazer isso sozinha.
— Isso pode mudar tudo — Piper falou — poderia acabar com os milhares de anos de hostilidade. Ela pode ser a chave para derrotar Gaia. Mas se não podemos ajudar você...
Ela não terminou, mas a questão parecia pairar no ar: seria mesmo possível salvar a estátua?
Annabeth endireitou os ombros. Piper sabia que ela deveria estar aterrorizada por dentro, mas fez um bom trabalho escondendo.
— Eu tenho que ter sucesso — Annabeth disse simplesmente. — O risco vale a pena.
Hazel mexia em seu cabelo, pensativa.
— Eu não gosto da ideia de você arriscar sua vida sozinha, mas você está certa. Nós vimos o significado que teve para a legião romana quando recuperamos a águia de ouro. Se esta estátua é o mais poderoso símbolo de Atena já criado...
— Ela pode representar uma grande recompensa — Leo ofereceu.
Hazel franziu a testa.
— Isso não é bem o que eu ia falar, mas sim.
— Exceto... — Percy pegou a mão de Annabeth novamente. — Nenhuma criança de Atena já encontrou a estátua. Annabeth, o que está lá embaixo? O que a está guardando? E se tiver a ver com aranhas...?
— Conquistada por meio da dor de uma prisão tecida — Frank lembrou. — Tecida, como redes?
O rosto de Annabeth ficou branco como papel de impressora. Piper suspeitava que Annabeth sabia o que a esperava... Ou pelo menos que ela tinha uma ideia muito boa. Ela estava tentando segurar uma onda de pânico e terror.
— Nós lidaremos com isso quando chegarmos a Roma — Piper sugeriu, colocando um pouco de charme em sua voz para acalmar os nervos da amiga. — Vai dar certo. Annabeth vai conseguir algumas boas recompensas também. Você vai ver.
— Sim — disse Percy. — Eu aprendi há muito tempo: Nunca aposte contra Annabeth.
Annabeth olhou para ambos com gratidão.
A julgar pelo café da manhã meio comido, os outros ainda se sentiam desconfortáveis, mas Leo conseguiu dar uma sacudida neles. Ele apertou um botão e uma explosão forte de vapor explodiu da boca de Festus, fazendo todo mundo pular.
— Bem. Foi uma boa reunião, mas ainda há uma tonelada de coisas para arrumar neste navio antes chegarmos ao Mediterrâneo. Por favor, reportem-se ao Supremo Comandante Leo para pegar a sua superdivertida lista de tarefas!
Piper e Jason se encarregaram de limpar o convés inferior, que havia se tornado um caos durante o ataque do monstro. A reorganização da enfermaria e do assoalho abaixo da área de armazenamento levou a maior parte do dia, mas Piper não se importou. Por um lado, ela passaria um tempo com Jason. Por outro, a explosão da noite passada havia ensinado a Piper a respeitar o fogo grego. Ela não iria querer que nenhum frasco desse material saísse rolando pelos corredores no meio da noite.
Quando eles estavam arrumando os estábulos, Piper pensou na noite em que Annabeth e Percy passaram ali acidentalmente. Piper desejou que ela pudesse conversar com Jason a noite toda, abraçada a ele no piso de vidro e desfrutando de sua companhia. Por que eles não quebravam as regras?
Mas Jason não era assim. Ele foi treinado para ser um líder e dar um bom exemplo. Quebrar as regras não era natural para ele. Sem dúvida Reyna admirava isso nele. Piper também... Na maioria das vezes.
Na única vez em que ela o convenceu a ser rebelde, eles estavam de volta à Escola da Vida Selvagem, quando haviam se esgueirado para o telhado à noite para ver uma chuva de meteoros. Foi aí que eles tiveram seu primeiro beijo.
Infelizmente, essa memória era um truque da Névoa, uma mentira mágica implantada em sua cabeça por Hera. Piper e Jason estavam juntos agora, na vida real, mas a sua relação havia sido fundada em uma ilusão. Se Piper tentasse convencer o Jason real a se esgueirar pela noite, ele faria isso?
Ela varreu o feno em pilhas. Jason arrumou uma porta quebrada em um dos estábulos. A escotilha de vidro refletia o oceano abaixo – uma imensidão verde de luz e sombra que parecia se estender infinitamente. Piper continuava observando, com medo de ver a cara de um monstro espreitando ou os canibais da água das velhas histórias de seu avô, mas tudo o que ela viu foi um ocasional cardume de peixes.
Enquanto observava Jason trabalhar, admirava a facilidade com que ele fazia cada tarefa, fosse arrumando uma porta ou ajeitando selas. Não eram apenas seus braços fortes e suas mãos hábeis, embora Piper gostasse daquilo também, mas o modo como ele agia tão otimista e confiante. Ele fez o que precisava ser feito sem reclamar. Mantinha seu senso de humor, apesar do fato de estar morto e se aguentando sobre os pés depois de não ter dormido na noite anterior. Piper não podia culpar Reyna por ter uma queda por ele. Quando o trabalho e o dever chamavam, Jason era romano até a espinha.
Piper pensou sobre o chá de sua mãe em Charleston. Ela se perguntou o que a deusa tinha dito a Reyna há um ano atrás e por que o modo como Reyna tratava Jason havia mudado. Afrodite a havia encorajado ou desencorajado a gostar de Jason?
Piper não tinha certeza, mas queria que sua mãe não tivesse aparecido em Charleston. Mães normais são bastante embaraçosas. Mães-deusas glamorosas que convidam seus amigos para um chá e falavam cara a cara, isto era simplesmente mortificante.
Afrodite tinha prestado tanta atenção em Annabeth e Hazel que deixou Piper desconfortável. Quando sua mãe ficava interessada na vida amorosa de alguém, normalmente era um mau sinal. Significava que problemas estavam chegando. Ou, como diria Afrodite, reviravoltas e mais reviravoltas. Mas também, Piper estava secretamente machucada por não ter tido sua mãe para si.
Afrodite mal olhou para ela. Ela não disse uma palavra sobre Jason. E não se incomodou em explicar toda a sua conversa com Reyna. Era quase como se Afrodite não achasse Piper interessante. Piper concluiu isso pela sua cara. Quando foi tentar falar com ela e fazer com que as coisas se arrumassem, Afrodite mudou para a mais recente fofoca como facilmente se joga fora uma cópia velha de um tabloide.
Todas vocês são histórias tão maravilhosas, Afrodite falou. Eu digo, garotas.
Piper não tinha gostado disso, parte dela havia pensado: Legal. Eu não quero ser uma história. Eu quero uma boa vida estável com um bom e agradável namorado.
Se ela apenas soubesse mais sobre como fazer relacionamentos funcionarem. Ela deveria ser uma especialista nisso, sendo a conselheira-chefe do chalé de Afrodite. Outros campistas no Acampamento Meio-Sangue pediam a ela conselhos o tempo todo. Piper tentava fazer o melhor que podia, mas com o seu próprio namorado, ela estava perdida. Estava constantemente duvidando de si mesma, sempre lendo as expressões de Jason, seus humores, seus comentários espontâneos. Por que tinha que ser tão difícil? Por que não poderia haver um felizes para sempre ou um passeio ao pôr-do-sol o tempo todo?
— O que você está pensando? — Jason perguntou.
Piper percebeu que ela tinha feito uma cara de amargor. Pelo seu reflexo nas portas de vidro do compartimento, ela parecia ter engolido uma colher de sal.
— Nada. Quero dizer... Um monte de coisas. Tipo, tudo de uma vez.
Jason riu. A cicatriz em seu lábio quase desapareceu quando ele fez isso. Considerando todas as coisas que ele tinha passado, era incrível que pudesse estar de tão bom humor.
— Trabalharemos nisso — ele prometeu. — Você mesma disse.
— Sim — Piper concordou. — Só que eu estava dizendo isso apenas para fazer Annabeth se sentir melhor.
Jason deu de ombros.
— Ainda assim, é verdade. Estamos quase nas terras ancestrais. Deixamos os romanos para trás.
— E agora eles estão a caminho do Acampamento Meio-Sangue para atacar nossos amigos.
Jason hesitou como se fosse difícil para ele dar uma interpretação positiva a respeito disso.
— Quíron vai encontrar uma maneira de pará-los. Os romanos podem levar semanas para realmente encontrar o acampamento e planejar o ataque. Além disso, Reyna vai fazer o que puder para retardar as coisas. Ela ainda está do nosso lado. Eu sei que está.
— Você confia nela — a voz de Piper soou oca, até para si mesma.
— Olha, Pipes. Eu disse a você que não há nada para ter ciúmes sobre isso.
— Ela é linda. Ela é poderosa. Ela é tão... Romana.
Jason largou seu martelo e pegou a mão dela, o que enviou um arrepio por seu braço. O pai de Piper uma vez a tinha levado para o Aquário do Pacífico e lhe mostrado uma enguia elétrica. Ele disse que a enguia enviava pulsos que davam choque e paralisavam suas presas. Toda vez que Jason olhava para ela ou tocava sua mão, Piper sentia algo assim.
— Você é linda e poderosa — ele disse. — E eu não quero que você seja romana. Eu quero que você seja Piper. Além disso, somos uma equipe, você e eu.
Ela queria acreditar nele. Eles estavam juntos, realmente, há meses agora. Ainda assim, ela não conseguia se livrar de suas dúvidas, não mais do que Jason podia se livrar do SPQR tatuado a fogo em seu antebraço.
Acima deles, o sino do navio tocou para o jantar.
Jason sorriu.
— É melhor irmos até lá. Não queremos que os sinos do Treinador Hedge sejam amarrados em torno de nossos pescoços.
Piper estremeceu. O Treinador Hedge tinha ameaçado fazer isso após o escândalo com Percy e Annabeth, assim ele saberia se alguém havia saído furtivamente durante a noite.
— Sim — ela disse com pesar, olhando para as portas de vidro abaixo de seus pés. — Eu acho que nós precisamos jantar... E uma boa noite de sono.

Nenhum comentário:

Postar um comentário